Portugal iniciou esta tarde, na Letónia, o seu percurso na Segunda Fase de Qualificação do Eurobasket Women 2015. O resultado saldou-se num 71-61a favor das letãs. Eis algumas notas da observação deste encontro.
Observações iniciais
A Letónia é um adversário de superior experiência competitiva e com um nível físico muito mais desenvolvido, algo bem notório a olho nu desde que as equipas entraram em campo. Portugal entra fragilizada nas opções de jogo interior e apresenta como mais-valia a possibilidade de apostar numa rotação intensa de jogadoras exteriores. A experiência de Carla Nascimento na condução de jogo é essencial para as lusas, enquanto para todo o grupo a palavra SACRIFÍCIO é lema – só em auto-superação Portugal pode ambicionar competir frente a uma equipa como a letã.
Primeira parte
Portugal sente grande dificuldade no ataque 5×5, por não ter soluções de jogo interior que permita circular a bola e desposicionar a equipa letã e por não encontrar oportunidade para impor uma velocidade de movimentos – o ritmo de jogo inscrito na equipa não o permite. A transição, na primeira parte, nunca foi rápida, deixando-se Portugal cair na teia das letãs. Mesmo assim, avançando durante boa parte dos períodos iniciais na frente do marcador.
Em termos ofensivos, Portugal procura os lançamentos de média e longa distância para fugir à “caixa” defensiva do adversário. Com 25% de aproveitamento no tiro de três pontos, a escolha do lançamento nem sempre é de qualidade. A penetração nas linhas defensivas adversárias é escassa e a leitura feita dos bloqueios diretos raramente cria oportunidades para as portuguesas. O seu jogo aproveita, ainda assim, alguma incapacidade de mobilidade lateral das adversárias.
Em termos defensivos, Portugal precisa de afastar as letãs do seu cesto. A jogadora mais difícil de parar é a poste Zane Tamane, que com 2m01 representa um desafio quase impossível de superar. Sempre que as lusas impõem alguma agressividade na defesa, sobretudo na pressão sobre a bola, a equipa letã sente dificuldades, já que Elina Babkina é a única base com qualidade superior. No entanto, a fragilidade das portuguesas revela-se na sua postura defensiva e a acumulação de faltas – Sofia da Silva e Lavínia da Silva vão para o intervalo com três faltas cada – torna-se preocupante.
Segunda parte
Portugal comete a maior parte dos seus turnovers na tentativa de passe para o interior (as postes não conseguem fixar posição para segurar a bola) ou nas tentativas de mudança de lado (pressão defensiva das letãs sobre a portadora da bola). Um parcial de 11-0 para as letãs nos primeiros cinco minutos do terceiro período criou um fosso no marcador. Durante esse tempo, Portugal foi incapaz de pressionar ou de atacar com velocidade. A Letónia, perante as dificuldades da primeira parte, regressou do intervalo muito mais focada nos seus princípios (circulação de bola e forçar de posicionamentos interiores) para se superiorizar.
O desgaste físico e mental foi-se revelando, com Portugal a perder as qualidades demonstradas na primeira parte do jogo. Os erros de execução tática e a a fragilidade técnica também causaram maior impacto. A equipa portuguesa utiliza as movimentações ofensivas de forma desapaixonada e mecânica, Raros são os momentos em que se vê uma imposição do bloqueio direto com peso e agressividade, assim como as leituras são quase inexistentes. Percorre-se as linhas orientadoras como obrigação e não com criatividade competitiva.
Na defesa, Portugal experimentou ainda uma zona que pudesse arrefecer a melhoria do tiro adversário, mas numa opção 2×3 sem dinâmica, os espaços acabaram por ser aproveitados para que a Letónia continuasse a solidificar a sua vantagem. Com apenas duas faltas cometidas nos primeiros dezoito minutos da segunda parte do encontro, percebe-se que Portugal desapareceu do jogo cedo demais.
Soluções
Não se cria uma equipa num curto período de tempo e as nossas seleções são reféns disso mesmo. Ao mesmo tempo, a cultura de jogo das equipas nacionais não permite também elevar o nível competitivo da principal representação do país. Às jogadoras que atuam no estrangeiro será exigido que tragam maior intensidade e maior conhecimento do jogo perante adversários deste nível, mas a renovação e reformulação da seleção nacional não se fará enquanto não se olhar para a constituição deste equipa como um desígnio nacional que afeta todos os clubes do país.
No imediato, é fundamental pedir maior agressividade defensiva e ofensiva. A velocidade de ações e a pressão sobre o adversário obrigarão a repartir os erros com a equipa adversária. A procura do melhor espaço para o lançamento obrigará a um correr do relógio que, na maior parte dos casos, será benéfica para a nossa equipa. A insistência na penetração obrigará, também, a que o adversário faça mais falta – as diferenças de estatura entre as equipas pode e deve ser aproveitada a nosso favor, pedindo-se, de novo, muito sacrifício e muita superação às nossas jogadoras. Quanto mais depressa estes princípios forem interiorizados na equipa, assim como quanto mais se acelerar a integração na seleção das jogadoras que mais prometem nos nossos escalões mais jovens, mais perto se estará de ter uma equipa que possa competir a nível internacional. E só depois disso se poderá pensar em vitórias.
Finalmente, dizer que o cenário negro que parece ficar desenhado neste artigo não é uma crítica – antes o assumir de que as realidades devem ser enfrentadas de forma a melhor ultrapassar os desafios que nos são colocados. O respeito e admiração pelo trabalho desenvolvido pelos técnicos responsáveis desta equipa fazem-me acreditar que, na generalidade destes pontos, a sua análise não deverá ser muito diferente da minha.
Luís Cristóvão