Luís Cristóvão

O mentor

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Sendo um tema que, ao longo dos tempos, não beneficiou de uma atenção formal da parte dos investigadores, o “mentoring” é reconhecido como uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento de atletas e treinadores. Parte dessa atenção formal não surgiu porque, ainda nos nossos dias, o conceito sofre de alguma confusão sobre aquilo que enquadra. Prova disso poderá ser o facto de não existir, também, melhor palavra em português (aconselhamento, inspiração, parecem falhar na tentativa) para substituir o vocábulo inglês.

A verdade é que, mesmo de forma implícita, o papel do mentor sempre esteve associado ao desporto. Na literatura académica isso foi identificado através de estudos a biografias de treinadores, mas basta uma conversa com uma qualquer pessoa que tenha tido uma participação desportiva ao longo da sua vida para encontrarmos ecos da influência que os treinadores, sobretudo na formação, tiveram no seu desenvolvimento enquanto pessoas.

O registo é inegável. O trabalho regular de um treinador com um atleta transforma-se numa enorme possibilidade de fornecer ao jovem, para além de informações sobre as habilidades técnicas e táticas de uma determinada modalidade, também um exemplo de vida, um aconselhamento nas escolhas académicas e profissionais, uma parceria que se supera a uma amizade, porque traz, em si, a diferenciação de experiências entre os dois envolvidos.

Podemos escolher o treinador?

Se numa modalidade individual poderá haver uma maior liberdade de escolha de treinador, nas modalidades coletivas isso escapa sempre aos atletas. No entanto, o encontro com o mentor acontece, habitualmente, sem uma estrutura formal a ele associada. Não escolhemos uma determinada modalidade por causa das características pessoais do treinador, antes pelo gosto que temos por ela, pela tradição familiar a ela associada ou pela espetacularidade da mesma aos nossos olhos de praticante.

Da riqueza da experiência de envolvimento e acompanhamento que nos é proporcionada na prática, nasce então o “mentoring”, que em boa parte das vezes também só é reconhecido muito tempo depois. Aliás, nos estudos feitos sobre estas relações, encontram-se definidas quatro fases. Uma de iniciação, em que treinador e atleta se conhecem e começam a estabelecer contacto, uma de cultivo, em que os laços se fortalecem e se estabelece uma grande parte da influência, uma de separação, em que o elemento menos experiente conquista a sua individualidade e, em muitos casos, se afasta do seu mentor, e uma, final, de redefinição, em que o papel do primeiro é reconhecido e incorporado na ação do segundo.

A aprendizagem nunca termina

Não se pode falar, no entanto, apenas de um processo de “mentoring” dos treinadores para os atletas. Na verdade, também na formação de treinadores é fundamental o contacto com técnicos mais experientes, cujo conhecimento supera, em muito, as características e conhecimentos sobre a modalidade. Aliás, mais do que através de manuais, cursos ou seminários, boa parte dos treinadores identificam os seus mentores como a principal fonte do seu conhecimento.

Nos seus primeiros anos de trabalho, um treinador só beneficia do acompanhamento de um elemento mais experiente, que o ajude a encontrar respostas para as muitas dúvidas que o seu trabalho suscita. O facto de não existirem estruturas formais de “mentoring”, leva a que estes processos obedeçam, sobretudo, a processos informais nascidos do cruzamento de interesses e personalidades do treinador mais experiente e do iniciado.

Mas também para os treinadores mais experientes os processos de “mentoring” têm fundamental importância. O constante contacto com técnicos mais jovens permite-lhes um renovar da linguagem, um testar e analisar das suas opções e um aperfeiçoamento das suas qualidades no confronto com as ideias daqueles que estão apenas a começar.

Soluções para quem está envolvido

As várias pessoas envolvidas no fenómeno desportivo podem encontrar soluções para melhorar as suas capacidades e a sua experiência através de processos de “mentoring”.

Para os treinadores, é fundamental o seu envolvimento em comunidades de prática, que tanto podem envolver outros técnicos da mesma modalidade, como técnicos de outras modalidades com quem partilhem princípios de ação e comportamento. Estas comunidades de prática podem, muitas vezes, assumir-se como centros de caminho para a excelência no exercício do papel de treinador, pela capacidade de análise, em grupo, que fornecem aos seus intervenientes.

Para os atletas e pais de atletas que procuram, também, soluções dentro desta temática, o melhor conselho é que procurem entre antigos atletas ou treinadores esse tipo de apoio. Muitas das vezes, e dado o caráter informal desta prática, o processo inicia-se num encontro, num pedido ou numa pergunta, que pode despoletar esse tipo de experiência tão enriquecedora para todos os envolvidos.

Em suma, enquanto não existirem processos mais formais de “mentoring”, é essa a solução que muitos antes de nós encontraram para aprender. Relacionar-se, observar, saber ouvir quem está por perto de nós. Sempre com o objetivo de sermos melhores e sabermos mais.

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