Semana 27: Da Violência

basket vazia

A reflexão mais difícil de fazer é aquela que nos obriga a repisar sensações que queremos reprimir, levando-nos a hesitar, algum tempo, sobre o escrever ou não escrever aquilo que realmente nos está a passar na cabeça.

Se eu pudesse ser apenas um ser humano de pensamentos positivos e focado naquilo de bom que nos acontece, diria que este fim-de-semana tive a oportunidade de ver os miúdos com quem trabalho fazer dois jogos excelentes, mostrando-se, finalmente, confiantes e crentes nas suas capacidades, indo buscar aquilo que sabem fazer melhor para juntar ao que imaginam ser capazes de fazer para ganhar um jogo e recuperar para uma desvantagem de apenas 12 pontos frente a uma equipa com quem tínhamos perdido por 30 na primeira volta. Diria ainda que, pelo meio, tive a oportunidade de rever um bom amigo, desta vez dentro de campo, ele a orientar a sua nova equipa, com um grupo de miúdos que combatem as suas limitações com uma aprendizagem intensa daquilo que é o jogo de basquetebol, eu a ajudar à realização do encontro como um dos árbitros da partida.

No entanto, para lá das coisas boas, este foi um fim-de-semana de violência.

Não quero aqui procurar culpados ou apontar dedos. Quero apenas colocar em cima da mesa uma série de questões que me parecem pertinentes e que, se resolvidas, poderiam por cobro a situações como aquelas com que me deparei neste fim-de-semana.

Em primeiro lugar, a falta de responsabilidade da Federação Portuguesa de Basquetebol e, neste caso, da Associação de Basquetebol de Lisboa, para organizarem provas. Se a função das mesmas passasse apenas por fazer calendários de competição, cumpririam plenamente com as obrigações. Mas como está a seu cargo delinear e fazer cumprir regulamentos, licenciar jogadores e treinadores, acordar com a Associação Nacional de Juízes de Basquetebol a existência de árbitros e oficiais de mesa em cada um dos encontros, então devo dizer que falham rotundamente. Falham porque os regulamentos têm, nos últimos anos, olhado mais para as necessidades dos clubes do que para a saúde e segurança dos participantes. Falham porque existem treinadores que têm licenças e não deveriam ter. Falham porque o número de partidas para os quais não são indicados árbitros é brutal e tende a “descambar” em situações que saem, muito facilmente, do controlo dos intervenientes.

Perante esta situação, os clubes veem-se confrontados com a necessidade de contar com a boa vontade de alguns “carolas”, umas vezes jogadores, outras vezes treinadores das respetivas formações, para exercer a função de árbitro. Se os árbitros oficiais que são apresentados em competições de formação já apresentam, tantas vezes, enormes lacunas de conhecimento e prática para o exercício da função, o que faltaria ir pedir agora a quem é “árbitro” por favor que fosse perfeito.

Por isto mesmo, não podem os treinadores intervenientes em partidas como esta ter atitudes que levem, de alguma forma, a incendiar os ânimos de jogadores ou espetadores contra um dos árbitros. Por muitas falhas que este apresente, é bom lembrar que está ali para que o jogo se realize, por não haver outra opção, pelo que não deve ser culpabilizado de seja do que for. É obrigação dos treinadores manter calmos os seus jogadores, não tendo atitudes reprováveis, não incriminando árbitros ou apontando “provocações” da equipa adversária. Muitas vezes, quem o faz, invoca o “calor do jogo” ou as “emoções” para o fazer. Quem é treinador, não pode deixar-se levar pelas emoções. Deveria ser algo claro, reconhecido por todos e controlado por quem licencia os técnicos. Pelos riscos que envolve deixar este tipo de gente, à solta, na liderança de uma equipa.

Porque se um treinador “perde a cabeça”, quem está na bancada sente-se habilitado para fazer o mesmo. Assim, mesmo perante os seus filhos menores, os seus amigos e familiares, “bons pais e mães” de família não hesitam em caluniar os “árbitros voluntários”, provocar os jovens da equipa adversária, tornando o que deveria ser um divertimento para todos, numa situação exageradamente desequilibrada e potencialmente perigosa.

Finalmente, se as crianças e jovens, no meio de uma situação de stress competitivo, ainda veem os adultos que são responsáveis (treinadores e familiares) terem este tipo de atitudes, será que esperamos que sejam eles a ter uma atitude de acalmar os ânimos? Será que um pai não percebe que, ao apontar o dedo para um “árbitro” ou para um “adversário” está, nesse mesmo momento, a apontar o dedo para o seu filho, que está ali, em primeira instância, apenas para se divertir?

Pelo que eu vi este fim-de-semana, pais, mães, treinadores, todos eles adultos, não percebem isso. E se, infelizmente, não tenho os poderes para os expulsar a todos, reivindico como meu o direito a condená-los a ficar.

Amanhã há treino.

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