Aquele jogo de Viena

juaryVinte e oito anos não passam depressa, por isso posso dizer que foi já há muito tempo aquele jogo de Viena. Para um miúdo de oito anos, a capital austríaca era logo ali, na televisão, onde o futebol só aparecia em momentos de enorme solenidade – por isso, semanas antes, tinha visto com respeito a vitória do Porto em Kiev, por isso com igual seriedade ficaria encantado pelo Desportivo de Chaves – Honved, uns meses depois.

Lá em casa ninguém era do FCP, ainda que o meu irmão fosse do Gomes, porque tínhamos conhecido o bibota na Serra da Vila, mais o seu carrão vermelho, quando ele foi almoçar ao restaurante do “Zé Inácio” no dia em que os Dragões jogaram com o Torreense para a Taça de Portugal. Não havia Gomes, mas havia festa. Os dois espalhados pela sala como que hipnotizados perante o Futre, o Madjer ou o Juary – e talvez fosse mesmo o brasileiro, porque suplente, porque improvável, aquele que eu mais admirava – frente a um Bayern onde todos eram mais fortes, ainda que com uns pouco impressionantes calções azul-bebé.

Não havia nada mais do que um jogo, uns heróis, um relvado, na televisão. Não importavam as discussões, as guerras, as rivalidades, o que fosse. Depois foram os golos e os dois a saltar em cima do sofá, o FC Porto era campeão europeu, que coisa tão nova e maravilhosa para um miúdo de oito anos. Foi por dias assim que, pelo menos no futebol, nunca nos sentimos pequenos perante a Europa. Começou há vinte e oito anos, naquele jogo de Viena.

Publicado por Luís Cristóvão

Comentador na Antena 1, Eleven Sports e SIC Notícias. Autor no Expresso. Analista de futebol, fala e escreve sobre desporto em vários meios de comunicação social.

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2 comentários

  1. Eu vi o jogo e, muito sinceramente, a equipa do FCP andou completamente perdida na primeira parte, a fazer o jogo defensivo típico do Artur Jorge. Ao intervalo, o que aconteceu foi que os jogadores ignoraram completamente as instruções do treinador (que se resumia a jogar, mais para não perder do que para ganhar) e jogaram aquilo que sabiam, aproveitando (bem) os deslizes defensivos da equipa do Bayern. Se o golo do Madjer foi fruto da inspiração de uma grande jogador, já o Juari, até hoje, ainda não deve saber como é que marcou aquele golo. 🙂
    É que claro que o que fica para a história é o resultado e o título ganho pelo FCP. Mas, que foi mais sorte do FCP e muito demérito do Bayern… Mesmo depois daquele excelente triunfo do FCP, em termos futebolísticos, os jogadores portugueses mantiveram aquela mentalidade típica lusa de achar-se inferior a tudo o que vem do norte da Europa e superiores a tudo o que está a sul do Magrebe. Daí a insuflação do ego quando acontece o FCP dar 3 a 1 ao Bayern. E quando em resposta leva 6 a 1 desse mesmo Bayern? Continua-se a eleger o tal jogo de Viena como um marco histórico de uma vitória de David sobre Golias e motivo de orgulho?
    Saudações

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    1. Claro que sim. O que está aqui em causa é a fantasia do futebol e por isso os grandes momentos ficam sempre marcados na memória. Para quê estragar um momento que se gravou desta forma, o tal David sobre Golias de que fala, na existência de um miúdo de oito anos? Os grandes jogos, acabem eles 3-1 ou 1-6, ensinam-nos sempre algo, permitem-nos sempre entender mais qualquer coisa do que é a bola, do que é a vida. Obrigado pelo comentário!

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