Se pelo que se vai lendo por aí, aqueles que olham para este Euro 2016 como um somatório de jogos onde o calculismo retira a emoção das partidas, quero lembrar-vos que o futebol sempre foi isto: mais uma espécie de clube de combate, onde se sofre terrores para se alcançar uma vitória que nos permite viver um dia mais, do que um espetáculo de arte, onde os mais virtuosos vencem sempre, quaisquer que sejam as dificuldades que lhes apareçam pelo caminho.
Aliás, hoje, no Vélodrome, não houve espaço para artistas. Não havia relva para isso, não havia equipas que abrissem grandes espaços para tal, não havia treinadores que acreditassem piamente na capacidade de desequilíbrio dos seus jogadores. A Polónia entrou a ganhar, depois de Cédric falhar a abordagem à bola, o que permitiu que os polacos desenhassem a sua transição-tipo, com Grosicki a correr pela faixa e Lewandowski a finalizar. Esse golo aumentou a dose de nervosismo da equipa lusa e permitiu que a Polónia recuasse para explorar as suas qualidades – a transição – sem ter a necessidade de tomar conta do jogo.
Os portugueses ultrapassaram essa ansiedade e começaram a construir jogo, notando-se que tinha superioridade sempre que apostava em sucessões de passes, no envolvimento, mas sem grande capacidade finalizadora, ora por não termos referência no meio, ora por aparecer muito bem fechado pelos centrais polacos. À passagem da meia-hora, Renato Sanches imaginou um dos seus rasgos em direção à área e, de pé esquerdo, rematou para o golo do empate. Daí para a frente, o que se viu foi uma Polónia a demonstrar limitações no momento da construção e Portugal demasiado indefinido no seu plano de jogo. O número de centros inconsequentes foram o sinal mais claro disso mesmo.
Empatar mais um jogo no final dos noventa minutos, no entanto, parece ser um destino da equipa portuguesa. No prolongamento ninguém esteve muito pronto para grandes riscos, sobretudo devido à consciência, de ambos os lados, que a transição defensiva das suas equipas é frágil. Pepe cumpriu 120 minutos de enorme qualidade defensiva, mesmo que na saída para o ataque continue a ser um jogador que destoa, enquanto Renato Sanches e Adrien oferecem ao conjunto português uma dupla muito dinâmica no ataque. Cristiano Ronaldo está, decisivamente, a fixar-se como ponta-de-lança da equipa, falhando as duas oportunidades em que a bola lhe esteve nos pés em zona de finalização. Mas também é assim que as grandes competições se ganham, com uma dose de sacrifício das individualidades pelo sucesso coletivo.
Nas grandes penalidades, todos cumpriram o seu dever do lado português. Os cinco jogadores que marcaram e Rui Patrício, que numa estirada fantástica para o seu lado esquerdo salvou o remate de Blaszczykowski. Se Portugal voltar a ter que desempatar desta forma, não se admirem se o adversário evitar o lado esquerdo de Patrício. Mas a verdade é que, num jogo sem artistas, Portugal foi quem mais quis ganhar e que, de forma mais consistente, esteve perto do golo, para além da perfeição nas grandes penalidades.
Alguém tem coragem para dizer que vencer no Clube de Combate é pouco?