“Isso que tu escreves é futebol ou poesia?” – uma pergunta banal para um sábado de manhã quando o sol começa a torrar na esplanada da cidade. Eu sorrio sempre para quem vê distâncias entre as coisas que eu entendo perto. Que se continue a estranhar que a poesia não está em todas as coisas que fazemos, desde a mais concreta à mais abstrata, da mais científica à mais artística, é uma realidade que não aparece nem às lentes que uso para enganar a miopia.
Poucos estarão disponíveis, no entanto, para se deixarem levar pela leitura de um Europeu inteiro debaixo desse signo. O futebol não é para poetas, tenho a certeza que isto já se disse em algum balneário, num intervalo de um jogo, em que uma asneira cabeluda tem sempre mais poder para abrir os olhos a quem anda distraído. Mas também é verdade que muitos daqueles que nos inspiram a seguir esta modalidade foram à poesia buscar ferramentas para nos encantar. Mesmo que nunca tenham lido um livro. Mesmo que nunca tenham escutado um poeta.
Há resposta para a pergunta com se iniciou o texto? Claro, há sempre uma resposta para tudo. Ver o jogo, hoje como sempre, tem muito mais do que ver o jogo dentro dele. Porque é relativamente fácil seguir apenas a bola, como também não é complicado entender que, ao invés de nos focarmos no pequeno ponto, devemos olhar para o quadro grande onde as coisas acontecem. Que uma equipa se monte a partir desse ponto ou das linhas que o envolvem são evidências que aprendemos a entender. A verdade é que não podemos ficar por aí para viver, de forma completa e integral, aquilo que nos oferecem.
Os melhores em tudo sempre foram aqueles que compreenderam melhor que cada área da nossa vida é apenas uma parte desse todo que continuamos a tentar explicar, sem o conseguir. Os melhores em tudo sabem que se aproximaram, mas só ao de leve, desses fatores. Eu continuo a aproximar-me, consciente de que não sou o melhor em nada. Entende o ponto (a bola), compreendo os seus limites, continuo a buscar a dimensão mental do jogo, que se revela, quase sempre, na sua dinâmica afetiva, envolta também num discurso político e social que dão a carga nervosa precisa para termos um espetáculo inigualável.
É por isso que não preciso que o futebol seja bom, porque o futebol é sempre rico. É também por isso que não preciso que o futebol seja bonito, porque o futebol é sempre complexo. É por isso que não preciso que o futebol seja só alegria, porque entendo a beleza que há numa lágrima. Isto que eu escrevo é futebol e é poesia. É a vida a levar-se, palavra a palavra, para o seu próprio entendimento. Fosse possível nela encontrar uma final para ganhar ou perder antes de começar tudo de novo.