O ideal olímpico em questão

Já se iniciaram as competições dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, que terão amanhã a sua abertura oficial, pelo que parece ser este o tempo certo para colocar em questão o que é o ideal olímpico nos nossos dias. Acredito que o facto de ser disputado em agosto não terá permitido muitas escolas de lançar as suas turmas em trabalhos que discorressem em volta da importância de participar e da excelência, da amizade e do respeito como valores base de um movimento que se estende há mais de um século. Mas mais importante do que entender porque é importante discutir esses ideais, seria tentar perceber porque é que eles se afastaram, definitivamente, da ideia de desporto que temos nos nossos dias.

Participação

Pensa-se demasiadas vezes que a ideia de “participar” entra em choque com a ideia de competir e, no fundo, está-se demasiadas vezes errado. A ideia da participação é um dos princípios fundamentais do desporto no mundo e estamos bem dentro do século XXI e ainda tão longe de podermos assegurar que toda a gente tem direito a participar desportivamente numa atividade. Isso acontece com o as necessidades de sustentabilidade económica das estruturas desportivas, nos níveis mais baixos, mas também se prende com o objetivo do lucro que está associado ao desporto de rendimento.

Não deixa de ser curioso que nos Jogos Olímpicos choquem tanto estes dois princípios. Na verdade, enquanto uma larga percentagem de atletas, nas diferentes disciplinas, tem como objetivo de carreira participar nuns Jogos, vários outros se sentem condicionados a olhar este momento como apenas mais uma competição, manipulados pelos interesses das próprias federações. Assim acontece com o Futebol, que viu a FIFA desobrigar os clubes de libertar os seus atletas masculinos para estas datas, “matando” assim qualquer possibilidade de participação a dezenas de jogadores, tal como acontece com o Ténis, depois do ITF ter decidido que a prova não contabiliza pontos para o ranking.

Associar, aqui, questões de responsabilidade para com o país e com os próprios Jogos é matéria acessória. No fundo, a generalidade dos atletas que falham a participação nos Jogos por opção são aqueles que não têm qualquer apoio da parte das instituições oficiais – que são distribuídos de acordo com resultados e não com ideias, lembre-se -, nem os próprios Jogos se impõem, hoje, como uma impoluta representação dos seus próprios ideias, mais como uma empresa que retira dividendos da realização de provas desportivas.

Excelência, Amizade e Respeito

Ultrapassada a questão primeira, preocupa-me sobretudo que os momentos dos Jogos Olímpicos não sejam mais aproveitados para a a divulgação desportiva, centrando-se, mesmo nas palavras dos seus representantes oficiais, no discurso das medalhas e das vitórias e não naquilo que realmente lhes interessaria potenciar. É fundamental que o momento em que várias modalidades beneficiam de tempo de antena em televisões, jornais e outros media pudesse ter sido trabalhado ao longo dos anos, tão bem e de forma tão dedicada quanto os respetivos atletas.

Seria, por isso, fundamental, que em cada modalidade olímpica se tivesse trabalhado a existência de especialistas que a soubessem comunicar e a soubessem promover junto do público em geral, mas sobretudo do público que mais lhe interessa, os seus futuros praticantes. Para isso, era tão importante quem estivesse capaz de se focar no trabalho das técnicas e da colocação em prova de todas as modalidades, muito mais do que um discurso tantas vezes miserabilista que rodeia as modalidades com menos recursos.

Isto deveria, também, contar não só para as modalidades que têm atletas presentes nas provas, como para aquelas que não as têm, até porque se não temos seleções de Andebol, Voleibol ou Basquetebol a competir no Rio de Janeiro, isso não significa que não se deva estar a trabalhar ativamente, dentro dos programas olímpicos, para dar espaço e atenção a cada uma destas modalidades. Se o trabalho não está a ser feito, então são mais anos que ficam se que perceba o essencial das responsabilidades de cada um.

E, tão mais preocupante do que qualquer outra coisa, o facto de, nos nossos dias, os Jogos Olímpicos estarem realmente a perder o fascínio de grande montra desportiva mundial, não se sentindo no acompanhamento das várias competições o mesmo entusiasmo que este provocava, perdendo-se assim, não só os ideias associados ao mesmo, mas, sobretudo, o conhecimento que o contacto com as provas desportivas pode criar.

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