A veces parece
que estamos en el centro de la fiesta.
Sin embargo,
en el centro de la fiesta no hay nadie.
En el centro de la fiesta está el vacío.
Pero en el centro del vacío hay otra fiesta.
Roberto Juarroz
Muitas frases famosas tentam explicar o futebol, da forma mais simples possível, como um jogo de onze contra onze. No entanto, na dinâmica do jogo, as variantes do número de jogadores diretamente envolvidos é muito superior a um simples 11/11, já que cada uma das unidades coletivas se pode dividir para enfrentar a outra unidade coletiva também igualmente dividida. Ou seja, o jogo passa por ser uma constante tensão entre superioridades, igualdades e inferioridades numéricas em determinada zona do campo. A realidade aponta para uma situação bastante complexa de funções matemáticas que se implicam umas sobre as outras.
O ponto de ligação entre as diferentes situações do jogo, que podem modificar-se em décimos de segundo, é a bola. A bola funciona como o elemento regulador destas tensões, posicionando-se como referência central da análise de cada situação. De uma forma simplificada, ouvimos muitas vezes que “elas contam é lá dentro”. Ou seja, todos os recursos do jogo estão apontados para obter o golo. Mas, como não há um caminho fácil para construir um golo – lembrem-se, estamos em plena selva matemática de constantes mutações de uma equação construída pelas dinâmicas das duas equipas – organizar a complexidade é a única solução.
A organização do centro do jogo ofensivo e defensivo procura, assim, “constituir-se [como] uma preocupação fundamental para o treinador, enquanto estrutura menos complexa da organização dinâmica da equipa”, como afirmam Vítor Maçãs e José Jorge Brito (1). Os autores propõem um raciocínio coletivo, onde o portador da bola tem o poder de decisão sobre a forma como incitar os comportamentos dos seus companheiros e adversários em busca do objetivo do golo. Conforme à sua decisão, os elementos que estão mais próximos na primeira, segunda e terceira linha de passe pertencem, também, a esse centro de jogo e comportam-se como tal.
A questão numérica, aqui, é interessante e deve ser colocada em causa, porque conforme a situação de superioridade, igualdade ou inferioridade do coletivo, o número de jogadores no centro do jogo pode aumentar ou diminuir, sendo que esse contexto será, também, fundamental, para a sugestão do melhor comportamento a tomar.
Mas continuemos. Para os jogadores da equipa do portador da bola que não estão dentro desse centro de jogo, Vítor Maçãs e José Jorge Brito propõem a assunção de “alguns comportamentos que contribuam para dinâmica coletiva da equipa, em termos ofensivos, mais próximos da sua dimensão macro”, relevando os conceitos de profundidade, largura e equilíbrio para precaver a situação de transição.
Esta ideia remete-nos para uma das ideias base do jogo de posição, que na sua leitura dos reajustes constantes, nos impõe esta noção de cruzamento de variáveis sobre variáveis. Ou seja, abandonámos o 11/11 para nos centrarmos na lógica das superioridades, igualdades e inferioridades, em 3v2, 4v3, 4v4, 4v5 e demais possibilidades. No entanto, para cada uma destas variáveis constrói-se uma segunda, que pode considerar-se, na maior parte das vezes, como o seu exato contrário, onde novas decisões estão a ser tomadas por cada elemento, por muito afastado da bola e do centro do jogo que este esteja.
A simplificação da análise do jogo leva, desta forma, a uma maior complexidade da mesma, gerando uma tensão externa que é, de certa maneira, uma presença constante, não só no jogo, mas em toda a sociedade. A tensão entre jogador e treinador. Porque quem joga o jogo são os jogadores (num crescente quadro de tomadas de decisão com e sem bola, na proximidade ou no afastamento da mesma), mas quem joga o jogo dos jogadores são os treinadores, organizando a perspetiva macro para que na perspetiva micro o caminho para o golo apareça. O interessante, aqui, é que o treinador tem que estar sempre consciente daquilo que está acontecer perante cada um dos jogadores, da mesma maneira que devemos ambicionar que cada jogador tenha a mesma consciência daquilo que acontece a si, aos seus companheiros e ao seu treinador.
Mas muitas vezes os jogadores não percebem isso, acham que só estamos a ser chatos ou “demasiado rigorosos”. Por isso, como dizes, experimentar, jogar muitas vezes, jogar até em funções de outros companheiros é decisivo para fazer crescer o saber sobre o saber fazer e não os obrigando a fazer só porque o treinador diz.
Ricardo Ferreira
(1) Vítor Maçãs e José Jorge Brito – Futebol: ensinar a decidir no jogo.