Passa-nos, todos os anos, debaixo dos olhos. Semana após semana, meio disfarçado, por entre as transmissões dos jogos dos três grandes e das principais equipas europeias. É fácil, muito fácil, que benfiquistas conheçam a maioria dos jogadores do Benfica, que portistas conheçam os do FC Porto, que sportinguistas que conheçam os do Sporting, que quase todos conheçam os onzes de Real Madrid, Barcelona, Manchester City ou Manchester United. E depois, a cada fim-de-semana, dá-se de caras com um Belenenses, um Estoril ou um Desportivo de Chaves que não fazíamos bem ideia de como jogava, que jogadores apresentava, que comportamentos habitualmente tinha.
Torna-se, assim, muito fácil ditar sentenças. O melhor jogador do campeonato fora dos três grandes só porque, contra um deles, fez uma boa exibição. As equipas que andam na luta pela Europa julgadas, como grandes equipas ou autênticos fiascos, pelos resultados que conseguem nessas partidas. As suas próprias estratégias analisadas à medida em que o seu adversário consegue, ou não, marcar golo. E, no entanto, é um longo, longuíssimo, campeonato, onde o trabalho de centenas de jogadores e treinadores, trabalho diário, de evolução constante perante as dificuldades que lhes são apresentadas, não pode ser resumido por um jogo, uma jogada, um vídeo ou dois lançados ao acaso.
Ontem calhou ao Luís Castro e ao Desportivo de Chaves. Aliás, esta temporada, os flavienses já sofreram goleadas frente ao Sporting (5-1), Benfica (3-0) e FC Porto (3-0 e 4-0). Fizeram o pleno daquelas equipas que se arriscam a passar para a história como um bluff. E, no entanto, as palavras do técnico do Desportivo são certeiras na forma como define o comportamento da sua equipa. Existe um caminho traçado e não faz qualquer sentido mudá-lo por causa de um jogo. Perceba-se, pelas suas palavras, que a expetativa é sempre a de se conseguir, com o modelo trabalhado, atingir competitividade. Mas isso nem sempre é possível. No entanto, a história da temporada só reforça que Luís Castro e o seu Desportivo de Chaves são das equipas mais competitivas e bem trabalhadas da Liga NOS.
Ontem também calhou ao Jorge Silas, mas, neste caso, o estar do outro lado do espelho. A equipa do Belenenses fez um jogo estrategicamente muito surpreendente frente ao Benfica, há duas semanas atrás, tendo sido das primeiras equipas, em 2018, a conseguir ler a movimentação encarnada no momento da transição defensiva para aí colocar entraves ao jogo do seu adversário. No entanto, depois desse sucesso estratégico (quase sempre que se fala de choque motivacional no momento da chicotada psicológica encontramos um trabalho estratégico que apura, num curto período de tempo, o modelo deixado pelo treinador anterior), a sua equipa precisa de ir encontrar a base com que vai abordar os jogos todos do campeonato. Tem sido essa a dificuldade, sobretudo quando as fragilidades do coletivo impõem duas derrotas pesadas frente a Vitória de Setúbal e Desportivo das Aves.
Para mim, fazem tanto sentido as declarações de Luís Castro como as de Jorge Silas na tarde de ontem. Ambas expressam de forma sincera, aberta, inteligente e clara, os desafios que são colocados aos treinadores de um campeonato que, bem para lá das partidas frente aos três grandes, tem um imenso equilíbrio e um constante desafio à arte de gerir equipas de futebol. Ficaríamos todos a ganhar se nos focássemos um pouco mais no trabalho que vão desenvolvendo.
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