O meu Torreense começa onde não me lembro. Por ter ouvido falar, lá em casa, o meu avô ou o meu pai, naquelas idas religiosas ao Campo Manuel Marques, onde ainda muito pequeno os comecei a acompanhar, junto ao pelado, não só para os jogos dos seniores, ao domingo à tarde, mas também para os imensos jogos dos iniciados, juvenis, juniores ou equipa feminina que ocupavam praticamente todo o fim-de-semana.
No Manuel Marques havia sempre bola para ver e essa entrega ao mistério do jogo que me levou a ficar preso a ele. A memória concreta mais antiga do meu Torreense, no entanto, não está nesse pelado, mas noutro, a uns quilómetros de distância, na Serra da Vila. Uma tarde a meio da semana em que o FC Porto visitou Torres Vedras, para um jogo da Taça, em 1984. Pequeno demais para ir para a confusão, fiquei com a minha avó, a ouvir o relato, enquanto corria a imitar algum jogador.
A partir daí as memórias começam a ficar mais sólidas. A correr jogos junto à linha lateral, a ouvir as conversas dos jogadores, as frases dos treinadores e dos árbitros, a correr para festejar golos, a esconder-me da chuva, a primeira viagem para ir ver o Torreense fora de casa, a Santarém, qual momento épico para um miúdo de sete anos. O meu Torreense cresceu, nessa altura, para lá do que um miúdo poderia imaginar. O campo relvado, a subida à Primeira Divisão (aquele salto ao ouvir o golo decisivo na Maia relatado num rádio a pilhas), a medição ombro a ombro com os grandes, o empate com o FC Porto em casa, com o Benfica na Luz, o trauma da descida, outra vez contado pela rádio, no meio de homens que mostravam que os bigodes também choram.
O regresso às divisões secundárias e à realidade, à conversa de que o clube e a região merecem mais, sem que nunca, na verdade, estes e a cidade se unissem para fazer esse caminho. O meu Torreense foi de viagens a conhecer o país inteiro e a organizar o meu calendário mental pelos dias de jogos que passaram ou ainda vão passar. Até que isso se transformasse, mais do que num modo de vida, na vida ela própria.
Foi por proximidade familiar que pude conhecer melhor o Torreense e a realidade que um clube vive quase na pele. As muitas coisas que se podem e não se podem fazer. As que se devem tentar e evitar. Uma aprendizagem profunda, com marcas, em muitos aspetos. Mas algo que, entre o positivo e o negativo, não me desviou do essencial. De viver o meu Torreense com o prazer de cheirar a relva, ao domingo à tarde, entre caras e vozes conhecidas, como quem faz uma pausa em tudo o resto e convive, uma e outra vez, com aquilo que tem de mais precioso. O lugar onde se sente em casa.
Publicado no “O Torreense”, nº 1, Suplemento do Jornal Badaladas de 1/fevereiro/2019.
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